sábado, 23 de abril de 2011

Ketherine


   Ketherine mantinha os olhos fixos no espaço em que estaria em alguns minutos.  Sentia-se nervosa como na primeira vez, mas não chorava mais depois de cada noite de dissimulações corporais. Ouvia o som das vozes a chamarem seu nome, ela as atenderia em breve. Sensualmente levantou uma de suas pernas e a apoiou na cadeira de madeira de seu ‘camarim’. Colocou a cinta-liga preta de forma mais delicada do que o preciso. Talvez ela ainda fosse.
   Equilibrando-se sedutoramente nos saltos finos, abriu totalmente a porta para o show de erotismo que ali, naquele velho palco de todas as noites, ela daria. E Ketherine enroscou-se no pole dance como se ele pudesse salvar a sua vida. Não a salvaria. E ela envolve-se na música instigante e envolve também todos os olhares desejosos que ali se mantinham em seu corpo de curvas tênues.
   Morde os lábios vermelhos para provocar, seduzir, enlouquecer. Gira, dança, erotiza. Desabotoa o vestido vermelho. Queria mesmo era poder deixá-lo em seu corpo, mas ninguém a pagaria por isso. Antes sonhava que alguém a tiraria desse lugar imundo e a levaria para uma vida tranquila. Alguém que a desse um lar. Mas, descobriu que aquilo não passava de uma fantasia utópica. Contos de fadas não existem.
   E o tecido é largado ao chão como que se não precisasse exercer mais nenhuma função. Não precisava mais cobrir um corpo, esse agora estava visível com tiras que atiçavam ainda mais o desejo dos alheios que ali vibravam com o produto, a mercadoria. Mãos a tocavam, ela sentia repulsa, mas precisava sorrir e agradecer pelos pensamentos maldosos que pagavam suas contas ao fim do mês.
   Terminado o espetáculo da sedução, ela veste-se. Não é o vestido vermelho que volta ao seu corpo, mas outro, tão delicado que ela nem parece ser a mesma que no palco provoca sensações de desejo nos homens. Coloca seu casaco de florzinhas rosa e saí pela noite, ruas quase vazias. Ouve uma piadinha aqui, um insulto ali.
   À sua frente, um casal dança romanticamente sob a luz da lua cheia. Ketherine chora depois de anos. Queria ser aquela garota, que envolvida nos braços de seu amado, bailava delicadamente. Ela não precisava atiçar o desejo, apenas existir para preencher o coração do homem que a protege extintamente. Ketherine chega ao velho apartamento, joga-se na cama e chora. Amanhã voltará para o palco de sua vida, o palco da sedução solipsa.

16 comentários:

  1. Um texto com características fortes. Marcante mesmo. Remete a reflexão sobre alguns contos que não são de fadas; são de uma realidade mais nua e crua.
    Gosto do jeito que você consegue descrever delicadeza, tão como consegue descrever aspereza.
    É bom variar os gêneros; é uma fuga constante do esperado. E melhor ainda ler essas suas variações, pois você as faz com astúcia.

    Beijo grande, moça.

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  2. Muito forte seu texto..Mais perfeito.
    Ketherine tão meiga tão sensual ao mesmo tempo
    Beijo moça

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  3. realmente este é diferente, mas nao deixa de ser muito bom. mostra a triste realidade de muitas meninas que ingressam nessa vida, muitas vezes enganadas, e nao podem sair....

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  4. Parabéns pela forma com a qual você lida com a palavra. Encantador saber que a palavra está em boas mãos para exercer seu poder e força.

    Fraterno Abraço

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  5. bem marcante suas palavras ;..

    Quer ser o destaque de abril? Cadastra-se.
    http://historiasdepamela.blogspot.com/2011/04/voce-no-era-uma-vez-mes-de-maio.html

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  6. me pareceu bastante interessante essa Ketherine...

    =)
    beijos, flor

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  7. Olá, moça...
    Estou passando de uma forma muito simples e ligeira por aqui para, apenas, lhe desejar próximos dias de muita paz e amor no coração! E que papai do céu jamais te largue, e que sua família seja sempre abençoada... e que o Espírito Santo repouse sobre a tua casa, sobre os teus amigos, sobre a tua vida!


    Beijos no coração...

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  8. Ah, já ia me esquecendo... meu msn: cdoficial@hotmail.com
    Quero muito falar com você,
    beijos

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  9. Adorei o texto. Um texto forte, mas com uma simples sensualidade. Que prente a atenção, nos agarra e nos faz sentir pena da principal. Um texto que nos faz pensar no porquê reclamamos tanto do que temos.


    Beijos

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  10. Jaynne, amiga!
    Linda composição de Keterinne. Gostei mesmo!
    Percebi que está com mais seguidores, bastante comentários, nossa! É o reconhecimento de um trabalho, viu?

    Puxa! Não achei o Brad por lá!!rsrsr
    Agora estou no Uruguay, voltando para casa, vamos ver se acho ele por aqui rsrsrs
    Beijos e obrigada por sempre estar presente no meu blog!
    De coração!

    http://anaceciliaromeu.blogspot.com

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  11. Toda vez que venho aqui fico sem ter o que falar, mas esse texto seu, indiretamente me levou a profundas reflexões que até mesmos as mais belas palavras fogem da minha mente com uma rapidez inesperada por mim. Em todo caso, achei nobre a maneira que você conseguiu descrever o trabalho de uma pessoa que, na maioria das vezes, não espera nada da vida porque a sociedade acaba tirando a esperança (pouca, mas alguma) que ainda tem nessas pessoas. E poxa, dói em mim pensar que no nosso país, na nossa cidade, no nosso baixo e até mesmo em nossa rua existem pessoas que tem que optar por diversas maneiras "diferentes" para assim mesmo poder garantir seu pão de cada dia, o pagamento das suas contas. A prostituição é apenas uma vertente das inumeras que podemos considerar. Como sempre, seu texto mexeu bastante comigo e possibilitou uma imensa reflexão em relação a tudo isso. Só tenho a agradecer. Uma ótima semana, continue com esse dom!

    Com carinho,
    Pedro.

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  12. Bem legal seu texto, reflete bem o que muitas garotas como Ketherine pensam, ao seguir uma vida que não é das melhores, mas ajuda a viver, e é o que tem.

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  13. Este comentário foi removido pelo autor.

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  14. Características marcante, texto excelente, a cada conto ou devaneio seu me disponho ao um emaranhado de pensamentos e emoções...

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  15. Ameei muito, queria te pedir permissao para colocá-lo em meu blog, lhe darei os devidos creditos !

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