terça-feira, 31 de maio de 2011

[Des]Amor


   Meu coração te esquece. Você finge não entender e ignora. Seu coração chora e o meu escuta os soluços intermináveis desse choro, mas em nada se abala. Ele assiste o drama de lágrimas inacabadas que escorregam lentas sobre o tecido vermelho pulsante. O seu pulsa triste, o meu com frieza.
   Sua tristeza questiona meu gelo. Você não sabe, mas meu coração não é de pedra. É certo que ele te esquece e se isola. Mas, algo pra ser esquecido, um dia há de ter sido lembrado. É um tanto confuso, eu sei.
   Perfurei seus olhos e defasei sua alma. Menti. Derramei no seu amor o desamor de um coração que te ama. Dei passos falsos por caminhos tortos. Não olhei em seus olhos, fechei os meus. Fiz-te sangrar. Sua cabeça baixa, minhas costas viradas. Seus sonhos, minha realidade. Teu eu cheio de mim, meu eu sem você.
   Tuas águas salgadas a rolarem escondido pela face, meu nó na garganta por não me importar. Seus gritos, meu silêncio. Seus olhos de raiva sobre os meus; meus olhos de culpa sobre os seus. Nossos olhares. Minha boca a induzir falsas palavras, seus ouvidos enganados ao acreditar. Mas, era uma mentira verdadeira, porque eu acreditei nela.
   Você se aproxima, eu me afasto. Você fica mudo, mas eu não me calo. Você se vira, diz que vai embora. Eu me encosto; você me ignora. Eu te encaro, você resiste. Eu te abraço; você desiste. Meu desamor enfim lembrou-se de você, lembrou que te ama...

quinta-feira, 26 de maio de 2011

O perigoso desafio de escrever

Linhas, papel em branco e... Você sangra!
Mil coisas em sua cabeça, mas uma em especial te persegue.
Noites escuras, e você ainda sangrando por dentro.
Ninguém entende, por que nem você mesma consegue, e tudo parece assustador em sua volta, até mesmo sua própria sombra, que de tentar fugir já se cansou.
Ah... O perigoso desafio de escrever!
Só lhe restaram agora papel e lápis, mas você tem medo do resultado final, do que vai sangrar pra fora. Você tem medo do personagem ao qual vai se colocar. Se fosse assim tão fácil escrever o que se é, palavras teriam mais sentido e seriam mais sinceras...
Mas você sabe que nem sempre é bom cuspir palavras. Principalmente no arriscado ato de escrever sobre o que se sente!
É arriscado quando o corpo ganha uma nova alma que não é a sua. É estranho deixar-se guiar por ela como se você a pertencesse. E ela te domina, narra à dor que deposita em seu peito, como se ele fosse uma caixinha para guardar tais sentimentos alheios; tão seus.
E seu corpo sente o que sua alma não sente. Suas mãos escrevem uma história que não é a sua, mas que te pertence. Você esquece quem você é, sendo outra. E quando as palavras ali são jogadas, como quem joga pra fora aquilo que não cabe dentro, você sente parte de um não-você saindo. E parte de você vai com ela. Involuntariamente.
 E as lágrimas antes tão suas, agora se tornam águas de outros olhos que não os seus. E o sangue que de você escorre direto para o papel, não possui o seu tipo sanguíneo. E quando você abre os seus verdadeiros olhos, e sua face voltou a ser a sua de verdade, ali você enxerga que derramou mais uma vez o seu sangue com a alma de mais um personagem, tão seu. Tão você.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Vai

   Desapareça.  Se esvaia na neblina da noite. Vai... Corra de uma vez... Mas, vá logo. 
   Não queira levar nada. Eu não vou deixar. Não faz mais parte de você nada que pertença a mim. Eu sou minha por direito. Leva suas tralhas de uma vez. Seu desamor, seus malditos pensamentos errantes. Coloque de uma vez nessa sua bagagem suas palavras frias, mentiras mal contadas, seu egoísmo. Leve-se daqui. 
   Ei... Mas, me deixe. Deixe minha tristeza e não sinta pena de mim. Deixe minhas palavras, pois não te dou permissão de levá-las; meus sonhos, porque eu tenho o direito de recomeçar; meu amor, pois um dia ele te esquece. Deixe minhas manias, meus defeitos, meus beijos, meus abraços, meus carinhos, minhas roupas, minhas xícaras, minhas lágrimas, meus risos. Deixe-me, mesmo que com um coração partido. Você não o levará com você.
   Pode ir. Garanto que o sol vai aparecer amanhã como antes. Que a chuva que escorrerá na calçada não vai jorrar por fora de mim. Garanto que eu não vou lembrar-me de você quando olhar para a caneca limpa à noite, nem quando o lado direito da cama amanhecer vazio. Garanto que suas piadas não me farão rir quando lembradas, nem chorarei pela falta delas. Então, pode ir...
   Vai... Porque não me resta nada no presente que me faça te pedir pra ficar. Não há sequer uma migalha de amor na qual eu possa me agarrar. E o futuro? Deixa que o futuro fica pra depois, e nele eu me ajeito. Porque, meu amor, você já se foi há muito tempo. E, mesmo que essas minhas palavras sejam mentiras contadas aos meus próprios ouvidos, você pode partir.

-Pauta para o Bloínquês- 71ª Edição Musical.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Os fios de uma máquina chamada coração...

   
   Despejo nesse lixo orgânico os destroços particulares de um coração que se vestiu de aço. Jogo nesse lixo químico todo e qualquer indivíduo que no coração permaneça instalado. Foi-se a sensatez. Obrigaram-me a manter minha voz presa na garganta, como quem nada tem a dizer e por isso se cala. Mas eu queria gritar.
   Com correntes subjacentes a leis tão deficientes, acorrentaram-me as mãos e me levaram. Eu quis fugir, mas as correntes feriram a minha pele. Deixaram-na sangrando nesse lixo tecnológico. Meu coração não precisa de fios para pulsar, mas acho que eles não sabem disso. Pensaram que dentro do meu peito eu carregava uma máquina, e acho que agora, já me convenceram a acreditar nesse espetáculo de baixar a cabeça e esquecer-me de uma voz presa na garganta.
   Quiseram fechar os meus olhos, acho que apertaram o botão errado, e eu fiquei fora de ar. Esqueceram de posicionar minha antena parabólica corretamente. Os únicos canais que agora apresento são os de raiva, dor e remoço. Mexeram nos fios errados, desconectaram meu bom-senso.
   Digitaram-me num texto cheio de regras, e eu me fiz sujeito sem verbo. Pulei vírgulas e cheguei a um ponto final. E ali fiquei. Mas me infiltraram numa interrogação medíocre, me posicionaram na corda bamba da chantagem, mas se esqueceram de que meu sistema estava com defeito. Eu disse um não.
   Uma troca de fios com mãos ágeis. Manipulavam-me. Trouxeram chaves de fenda, óleo, um novo fusível, lubrificante, e implantaram um novo coração, mais fios...

domingo, 15 de maio de 2011

Seus passos

Seus passos,
O compasso de um coração;
Lento, cabisbaixo.
Tumulto da dor.
Brasa, corpo, solidão.

Seus passos,
Esses que me levam
Vento afora.
Descansa e corre veloz.
 Vez em quando me devora.

Carrega-me a voz
Seu ritmo confuso.
Perca de sentido:
Meus olhos intrusos
No tempo perdido.

Seu corpo
Leva o meu no salão.
Cubro no ritmo as pegadas
Deixadas pelo coração,
E por seus laços.

Seus passos
Conduzem-me nessa dança.
De ritmo quente ensaiado.
Sem pausa, com dor.
No ritmo de um coração:
Despedaçado, mas cheio de amor.

-Pauta para o Bloínquês- 39ª Edição Poemas.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

O Sequestro das Palavras

   Fiquei mudo. Calado perante a confusa frieza instalada no coração dela. Calado diante do meu desespero. Incapaz de pronunciar uma única palavra, essas que antes me vinham com tamanha facilidade... Fugiram.

   Ela mantinha seus olhos vazios sobre os meus tão cheios de medo. E de alguma forma o silêncio era quebrado, sem som, sem palavras. Quebrado como quem quebra os fios frágeis da confiança em si mesmo. Eu não me sentia mais seguro perante a minha subjetividade. Ela me desarmou, me deixou indefeso ao silêncio mortal. Foram-se as minhas palavras.

   Eu a havia dito antes que um poeta amava para escrever sobre o desamor e sofria pra falar de amor. Pelo menos, sempre foi assim comigo. Mas e agora? Que sentimento é esse que ela me causa que nada escrevo e nada falo? Eu a alertei de minha bipolaridade emocional. Bipolaridade de quem vive o que não se sente, de quem empresta o corpo a um personagem. Alertei e falei sobre toda essa confusão poética.

   Eu já quis fugir dessa situação na qual nos colocamos. Eu já tentei de tudo, mas ela não deu ouvidos. Acho que no fundo ela sabia como desarmar um poeta. Como sequestrar suas palavras.

   Virou-se indiferente, dando-me as costas como quem oferece flores. Flores de um perfume meio doce, meio ácido. Deu alguns passos. Continuei calado, parado, vazio de mim. Ela pegou algo, virou-se de volta como quem retira as flores. Voltou devagar, olhos como brasa acesa.

   Tocou minha mão com delicadeza e a estendeu sobre a sua. Com a outra mão ofereceu-me papel e caneta. Eu a encarei um tanto assustado, mas segurei o papel. Ela se aproximou ainda mais. Meu coração pulsou forte. Encostou seus lábios quentes em meu ouvido e sussurrou: “Fale de amor, meu amor.” Estremeci. Aquilo era um adeus? Não importava, o papel me seduziu novamente, e como poeta apaixonado eu me rendi, minhas mãos conduziram a caneta num tango ardente. 


De quem nas linhas românticas sofre.

De quem ama e entrega-se ao desamor.

Tu sequestras minhas palavras

Tornando-me poeta sem pudor.


-Pauta para o Bloínquês- 66ª Edição conto-história.

sábado, 7 de maio de 2011

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                             Dor

   
     Está sentindo? Eu sei, seus músculos enrijeceram... Consegue sentir agora? Isso é o início do ciclo vicioso que eu alimento, com prazer. Cale-se! Eu havia te avisado. Não corra... Pra quê tanta pressa?
     Grite para o meu silêncio. Se agonize no sangue cortante na veia que, por dentro, escorre como uma ferida aberta. Fui eu com minha espada cortante. Com minhas mãos ágeis. Sente o ácido do meu veneno? Querido, as lâminas estavam contaminadas.
     Encosta. Chega mais perto desse corpo criminoso. Deixa-me tocar nesse teu peito torturado. Vai! Derrama teu sangue na minha pele fria. Peça clemência! Implore!
     Encare-me com olhos de angústia. Imponha em seus gritos o som fonético da raiva. Ouça os meus risos prazerosos ao teu desespero. Fuja com passos de saudades. Volta e me abraça com dor. A dor que sentes no peito aflito e decifra-me com seus lábios de amor.


-Dedico essa obra a um de meus leitores fiéis, Emerson - Emo, para os íntimos, rsrs.
Conheçam seu trabalho- execelente, por sinal- aqui: Deposito Urbano!
     Abreijos!